sexta-feira, outubro 23

por inteiro

eu te bebi por inteiro
pra saber se realmente era você,
você, ó letra das letras, verso dos versos.

eu te comi por inteiro
pra saber se causava o mesmo efeito,
efeito das leituras, de horas.

eu te olhei por inteiro
pra saber se tinha a mesma estética,
estética, ó beleza do belo, esticada pela folha branca

eu te colhi por inteiro
pra saber se saiam de você as mesmas idéias,
mesmas idéias que invejei durante vários outonos.

eu te amei por inteiro
pra saber se você ia me dar atenção,
atenção que eu ia precisar pra ser igual eles.
atenção que chegou, e está aqui,
presente nestes verdadeiros versos.

Tra(duz)indo

é o som e é o sentido
amargos ao pé do ouvido
vindos de uma sutil traição,
da perda da essência.

Rimbaudeando alguns sentimentos,
sentindo, bêbado, um barco se aproximando

Je ne me sentis plus guidé par les haleurs

perdi todo meu rumo.
meu rumo jovial e nostágilco se foi,
foi pr alonge da minha alma sóbria,
indo para meu corpo bêbado, se afogar.

corria! Para as marés.
Me lavava com o sal vermelho
que correu junto d'água que levou minha sobriedade.

eu trai meus livros e autores
mas traduzi, ao meu ver,
seus sentimentos.

sexta-feira, outubro 16

Eles

correram vários deles
correram até meu quarto
correram e me surpreenderam 
correram eles 16/10/2009

me deram vários deles
me deram o eu queria
me deram de maneira estranha
me deram me deram

brigaram eles comigo
brigaram eles no meu quarto
brigaram a força maior
brigaram se razão

dormiram eles com remorso
dormiram eles me esperando
dormiram eles me xingando 
dormi pensando neles.

terça-feira, outubro 13

Dorme

Levanta a mão
Pede por ajuda
e sai dessa,
merda.

Dessa merda
que todos nós vivemos
ontem, hoje,
de manhã, de tarde e à noite

sai logo,
enquanto há tempo.

Tenta dormir
e varar dias nos teus sonhos: vivendo.
Vivendo na utopia de ser feliz.

Domingo

Há sempre esse monstro
subalterno a nossa situação

Vive das nossas sutis desgraças
e vive no fundo, bem no fundo do coração

Mesmo depois de horas de paz
é impressionante como ele põe a cabeça pra fora
e mostra toda sua força

o que você quer que eu faça? se ouve.
Hein?? Vai explicando!

Dói saber que as pessoas se divergem.
Mas aceitamos,
aprendemos,
e amamos,
cada vez mais.

Maneco

Eram quase dez da noite e o Maneco estava indo embora da casa da sua namorada, como sempre.
Os próximos sete minutos seriam normais e corriqueiros, banais, mas foram diferentes.
Chegando na praça do asilo, cumprimentou os velhos do Bar do Ponto e continuou andando e olhando lá dentro, fitando os copos e porções de torresmo no balcão e nas mesas.
Cachorros, bicicletas e postes iam passando por ele. Até chegar no escadão que desce para o Tijuco.
- Seu bosta, volta aqui.- foi o que ele ouviu, e foi o que apagou os cachorros, as bicicletas e postes do caminho.- É, você mesmo, playboy.
Arriscou correr, mas não ia adiantar. Dois vinham de frente.
- Aê, vacilão.
- Calma velho...
- Calma nada, mermão.
- O que vocês querem, eu dô, eu dô.
Eles não queriam nada de mais, estavam curtindo a noite, da maneira deles.
- Dá a carteira.
- Tudo?
- Vai, vacilão.
Maneco deu a carteira, que estava vazia, limpa, sem nenhum puto.
- Zuou, né?
- Eu não tenho nada, deixa eu ir embora.
Ele não foi embora sem dar nada a eles.
Não tinha dinheiro, então deu o que tinha pra dar.
Os velhos do bar, os cachorros e as bicicletas estavam muito ocupados para ouvir os gritos, o desespero, e a dor de Maneco.
Depois que terminaram o que tinham que fazer, deixaram ele ir.
- Vai cuzão, vai. Sem caguetá ein? Se não vai ter de novo. Se liga!Vai!
- Porra véio - falou um outro, enquanto o Maneco já tinha saído mancando - queima ele.
- Aqui?
- É, vai logo, porra.
Foram três tiros. Um nas costas, de longe, e dois na cabeça, à queima roupa. Pra ter certeza da morte.
Passaram diversos sete minutos até o amanhecer, até o acharem ali.

sábado, outubro 10

Fogo Colorido

o cigarro cantou na minha boca,
cantou o que ele queria

queimou todos meus planos
queimou tudo que queria

cantava sobre os livros,
e sobre os rocks, cantava.

meu isqueiro não tinha mais um cheiro de fogo.
foi esquecido como meus planos.
e como estes foi trocado por outro.

só o desgraçado do cigarro continuava o mesmo.
queimando e bebendo minha vida.

ele me colocava em sua boca e ateava fogo.
mas não um foguinho qualquer,
um fogo enorme
com todas as cores que tinha direito.

as cores da minha vida,
que iam virando nuvens de fumaça,
pouco a pouco.

sexta-feira, outubro 9

1, 2,
1, 2, 3, 4.

Crocodilavam sem parar.
nenhuma alma deixava de lado.

sei lá se era bom ou ruim.
era de momento.
todo mundo estava afim
era mais que tormento.

Pararam de rimar
pra ficar mais divertido
mas ainda tinha ritmo
e vontade,
e coragem,
e amor.

Foram chamados de loucos,
mas, como não eram poucos
rebelaram.
anarquizaram.

Corriam escuros e rasgados pelos bares escuros.
tiveram prés, eles e pós.
hoje são esquecidos.

quinta-feira, outubro 8

50's

Uivaram o dia
Nasceram na folia

Falavam em progresso
Viraram sucesso
Morreram na agonia

Não tinham medo
Viviam em recesso

Colhiam do azedo
cultuavam o sexo

Comiam drogas
Comiam-se todas as horas

Pegavam a estrada
subiam as escadas
escadas da morfina
e heroína.

terça-feira, outubro 6

Cozinha

eu não sabia se escrevia, se lia, se cantava, se cozinhava.
Tinha um, dois livros.
três cebolas, uma partitura e um lápis sem ponta

perdia a conta,
toda vez perdia a conta

não sabia se era melhor o livro, ou as duas cebolas
ou a lapiseira, não sabia.

Liguei pra tia,
pra tia Maria.
Era cozinheira das boas.
escrevia, cozia, lia.

tudo estava prontinho,
só faltava um temperinho, um banquinho
e um tempinho.

tempo eu não tinha.
a tia minha, tinha.
tempo pra tudo,
pra ler, escrever, contar, cantar, comer.

ela mexia a colher
com a força de um homem, e a destreza de uma mulher.
cortava os ingredientes e jogava tudo na panela,

tudo estava prontinho.

mamãe dada

caligrafia maneirista
chumbo escrita

coliforme dentista
mandruvá jornalista

vermelho amarelado
limão salgado

lado do dado
número desafinado

teclado desconfigurado
índio sentado

canção atemporal
criança no vendaval

samba no carnaval
amor carnal.

segunda-feira, outubro 5

Medo

há um medo
um medo enorme

cruzo um só dedo
esperando que o medo se conforme

não sou sua vítima
não estou na sarjeta

coloquei todos os outros num trem
que vai pra longe, bem longe

estava me enchendo
eu não estava crescendo
estava ficando esquecido
eu não estava pronto

fugi pra bem longe, bem longe
mas pra outra direção

fui indo, até cansar
cansar de andar
e de ter medo.

quinta-feira, outubro 1

O cheiro

eu quase podia tocar
no  cheiro daquela melodia

atravessando a rua, rua cheia
moderna, cheia de sons e cores

fui seguindo só um.
um só, eu fui seguindo
e passando, e andando,
ouvindo, cheirando.

Quase atravessando a rua
virei.
olhei,
cheirei,
escutei,
pensei.

só naquele cheiro de música boa, pensei.
estava ali, bem atrás de mim.
sempre me seguindo,
e eu nunca conseguindo pegar.