sexta-feira, julho 30

bromélia

expresso minha indignação
quando por falta de intelecto,
subalternos nos acabam o verde da sala de estar.

como se fosse aula,
foi dito para que embebedasse de leve
nossas verdes folhas.

- mas não!
cirrose até cessar o sangue que flui pelos floemas.

vejo os prantos de minha superiora
que me afloram pequena raiva
- sentido tão vago em mim,
mas que brotou junto da desfloração da bromélia.

quinta-feira, julho 29

a difícil leveza de ser

bela magia de ser,
que tanto se deseja,
rogo-te, oro para que seja vizinha,
quem eu possa tomar um café à bela companhia,
seja um retrocesso fulminante,

[que pega fogo,
no amarelo da chama...
me evaporando pelo ar,
distribuindo minhas cinzas
junto ao vento.]

imploro que me seja leve,
leve ao meu ver,
ao meu sentir e tocar.

seja hormônio para meus olhos,
calor para meus demônios,
e pena de anjo quando eu
cessar a queimada.

mostre-me seu mago,
para que eu aprenda
como sintetizar outros truques,
outras novas magias.

outras novas lenhas
para queimar mais forte minh'alma;
meus sentidos.
fazer brotar deles glândulas de fogo.

arde, chama

quero tanto,
pois creio que ser
é vital:
é árvore de vida,
florida de amores.

não o ser de simplismente
estar vivo, em chamas...
mas o ser de saber viver,
de ser o fogo,
e não se afogar nele

deixe a porta aberta

reparo como os olhos,
são portas.
portas da percepção,
portal para a alma.
viela para o sorriso.

quando,
os que são como os meus
- sofridos pela natureza míope-
encontram transparentes lentes,
uma árvore torna-se árvore, e não borro verde,
pessoas são pessoas,
pássaros voam nítidos,
bocas se abrem sem chiado,
bochechas se coram,
crianças correm livres,
cordas vibram,
balanços pairam sob o ar.

há quem possua portas lacradas,
seladas,
escondidas das cores,
cortadas das flores.

me guie por suas estradas tortas

me torno pão
vinho e diversão
de meus versos.

prefiro assim,
quando sou guiado,
e não sou guia.
quando cerro os olhos
e versos me escrevem

prefiro assim
à me esforçar.

a fluidez
é sã e bela.
mais bela que a força,
que nalgumas horas
tive que usar, só para
mostrar minhas lágrimas

sou folha

escreva suas lágrimas
em meu pranto,
escorra teus olhos pelo canto
e deixe de lado as fogosas lástimas.

corra de encontro ao vento,
vá de cara ao medo
que te afronta quando sente
que estou ao lado.

mergulhe em nuvens brandas
de saber,
pintadas à mão
no azul escuro que és teu céu.

escreva seus risos em meus lábios,
e deixe-me corar seu rosto,
com um só suspiro.

quarta-feira, julho 28

meu sofá

sinto a maioria pensante,
a rua esburacada,
a desconstrução,
a timidez,
a espuma do café,
os números da bolsa,
o entendimento da hipocrisia.

sei que estão sentados aqui,
ao meu lado.

filha das cinzas

sempre que a importância
me invade, me sinto como estou.
cheio, gordo, fluente, sorriso.
mas hoje é diferente.

hoje me sinto no agreste,
no sertão morto,
na terra falida.

engolido por fênix,
brotada de meus próprios sonhos.
que me arranca a pele,
e me planta suado ao seu próprio sol sertanejo.
queimando meu corpo,
meu cérebro,
meu ser,
meu eu mais belo.
ser belo, que pode lhe ser útil.

mas,
quer fogo, mais fogo.
por ter vindo dele.
quer o calor lhe invadindo as ventas.

[não digo que isso me atrapalha, que faz mal,
ou que ao menos ligo...mas,
sou sincero].

pavão misterioso

umas imagens
me chegaram ontem.
duas delas, mais foscas que a própria vontade
de ser.

de onde vieram, não me contaram.
mas espero que seus perfumes sejam verdadeiros,
mesmo que descompassados.

uma delas é vontade,
e a outra pode, pode ser paixão.
e elas vêm do fogo e cinza.
para me borrar mais a visão.
para anestesiar minha mente e saliva.

terça-feira, julho 27

minha cadeira de dois lugares

onde vão?
quão longe deixam
papos e pingas e flores?

não sei onde,
mas os vejo indo.
não concluo se isto é bom,
ou ruim.
mas vejo.

desejo, talvez,
ir junto.

mas por hora, fico sentado
na companhia do cigarro
e dos óculos escuros.
do pó e da ave.

quarta-feira, julho 21

floral haikai

cresce rápido,
o marrom, o verde,
e logo depois a flor, seguida do fruto.

terça-feira, julho 20

me dê novamente meus sentidos

saliente medo,
que afronta meus lençóis,
vá-te pra fora,
pro frio e lua.

deixe-me apaziguar meu tempo,
serenar minha sobriedade.
peço-te que vá.

corra no mar,
que mora em ti,
nos teus olhos fundos e altos.
que vagam pelas minhas costas e vida.
peço-te que vá.

vá para sertões mais distantes,
mais remotos de pensamentos e sorrisos.
peço-te que vá.

peça de um jogo
perdido por mim,
és tu.
és tu, medo oblíquo.
remete à tudo e todos à minha volta.
peço-te que vá.

peço-te que me deixe livre,
leve,
peço espaço para ver,
cor para sorrir,
e sabor para sentir,
peço-te, humilde, meu ser.

logo pela manhã meus olhos cinzas

por que tão cedo?
por que descolo meus vãos,
logo pelo primeiro fio de sol?

formam-se vielas em meus olhos,
todas cheias de solidez mental e vigor de criança.

nos vãos,
o ar sopra duro e reto,
nem uma curva de devaneio e digressão se forma
por entre os mil amores.

são três dias corridos do mês,
e já jogam concreto em olhos meus,
para que essas ruelas se formem,
tão cedo, tão cedo.

segunda-feira, julho 19

poema amor

salvo o olhar,
amar é como água.
um serene pecado
que dá a partida do conviver
muta-se em calor, no suor
quase que religioso.

é como respirar,
transpirar o coração
pelos poros e palavras.
sangrar segundos de conforto;

dar, à quem for, rosados lábios,
não temendo o após,
não sofrendo os males públicos,
é ser,
é ver mais de perto
o cheiro do macio,
livre e leve.

quarta-feira, julho 14

bússola

o norte
está apontando pra cá.
e creio que ser feliz,
é aqui.

grito óptico

derramo meus olhos ao chão.
talvez doa como vampiro,
mas dor que me vem por hora,
emerge risos e noites de verão.

noites compridas de serenatas,
afinadas à sua viola.

eles rodam e rodam
sugando tudo que encontram.
pelas pupilas e cílios
vão entrando calor,
flor e bocas.

até saliva seca,
de mórbida ressaca da agonia.
ah, a  mística ressaca da vínicola.
pai e mãe de manhãs infinitas.

entram outros olhos, talvez.
e desses saem medos traduzidos,
ilusões metamorfoseadas em azul ou verde.

azul que é a cor do céu,
mar, pano, pavão, maria,
olhos seus, meus,
cor da urbe, da tela,
do ser, do viver.

verde que é.
e sendo,
recolhe meus olhos e me dá.

[pelo menos, agora,
terei recheio neles.
estão em erupção de sons e sentidos,
eles gritam.]

sopre quente em todos os lugares

és vento,
agarrado em galhos cansados.
vento que corre vespertino,
que corre o mar azul sempre que dá.

que corre o mar infinito verdejante.
vento de todos gostos,

és vento,
um señor tão bonito,
a tônica de versos do inverno.
vivo como a cor que,
com pincel, pintou em suas flores,
livre, tal qual a onda do sol,
que te barra em dois ou mais poemas.

me imagino em forma
desses galhos,
galhos que agarram seu ar,
seu mar. seu pincel de veredas indecifráveis,
vielas nas quais enxergo pouco,
e mesmo sendo cego à estas pequeninas manchas de realidade,
me perco ébriamente em seu soprar,
ó, vento.

terça-feira, julho 13

onde se encontra?

onde estou no mundo,
que cores não me guiam?
onde estou no tempo,
quando o sal já me arranca a pele?

será que não mais terei a sorte de viver?
a chance de sentir o cheiro do azul,
ou até mesmo o calor do fogo?

quaisquer vontades são nulas,
onde terra não vive mais,
onde o canto desafina,
e versos se sentem presos,
pois não conseguem dançar.

sexta-feira, julho 9

o nascer solar

a lua se despediu hoje,
me deu abraço fulgaz e saiu fina.

disse segurar mão versada,
disse-me segurar corpo quente,
disse-me que fica em pó,
ventando em minh'alma.

lembro de estar bela,
como cheiro de um velho lírio,
estagnado no tempo da orgia de amor.

como montanhas,
que cortam terra diante nossos olhos.
[aqui, as vemos, mas no horizonte elas somem, bem ali, de frente à crianças de barro]

é como se tivesse ido,
e deixado rastro  de linho azul,
me enfernizando alma faminta.

a mancha de céu
que desenhei por outras diversas horas
está brochando.

minas

sei que ele
é.

o céu de voz,
nuvem de mar doce flutuante
em ouvidos.

sapo dos bares negros,
pelas estradas escravas das minas geraes.

uma faca amolada
de fé amorosa,

uma fazenda cheia de fumaça
e sol quente.


defino, pois, amigo de noite só.
o escravo de meus discos,
a agulha que vos traduz em nota.
uma onda transcendendo o horizonte de meu leito.

o vinho de todo dia,
a fé que está.

a luz que brilha fosca no breu de me ser.

hesito, mesmo, trocar o disco.

flor

a manga rosa,
me guiava pela estrada.

dias e dias mais pedi à ela.

meu corpo lá, suava,
soava, timbrava mil sons de cores
onde fizeste a morada.

a rosa, meu bem,
me pedia mão, e palha,
fonte de idéias, e cachaça.

dai-vos-ei a flor da montanha,
para viver de coração,
sem machucar outrém.

para fluir-te a consagrada,

inimiga do frio e garganta,

parceira do cheiro forte,
de manhã cedo,
onde nasce o tenso e dor.

onde nasce nosso menino,
fruto da terra
que nos dá de beber,

e ele é à nós pensamento,
raciocínio pesado
quilos de poeira e grama,
entrando pela nesga da janela aberta.

acredito na boca entreaberta

queira ser feliz,
queria, se sorriso lhe toca gentil.

queira se amor lhe é confortável,
se mel escorre doce,
se flor brota do cheiro da terra,
como se fosse risada.

ser feliz,
nos cabe ao certo,
dá o destino da saudade,
a vontade do futuro,
e o prazer do que acontece.

segue os olhos cheio de lágrimas,
pasmos de quaisquer bobeira;

segue o sorriso,
que sucesso, sucedará.


creio não fazer isso ao pé da letra,
mas o poema é sinceríssimo.

quinta-feira, julho 8

outra vez mais, quero

abro o pacote de lábios.

doce e beiço.
como o de tal anos atrás,
que perdura por ventos inimigos,
que dura entre outros beijos,
de outros marcianos.

não esqueço, como era.
de trás de brincadeiras de crianças,
como se fossem adultos.

e foi indo,
assim, periodicamente belo.
de tempos em tempos,
vivendo romances de abraços,
e beijos relâmpago.

a lua é diferente

escrevo torto,
teço linhas judiadas,
pelo vento.

e quem tem fome
de mim?
ninguém.

um sabotado
poeta,
unicamente grande
pra mim mesma.

minha pele sua, por hora.

e não vejo.

creio na porta de entrada,
por que sair
e desejar errado,
deixar para trás
o filme rodado,
a letra escrita,
o sonho acordado.

é como o sol pelo anoitecer,
que nos esquece de alumiar.

terça-feira, julho 6

relva

espanto a lucidez
que acaba de pousar em minh'alma.

dou-lhe um tapa
e esta responde na consternação da vida.

talvez seja natural,
meus sonhos que saem como brisa,
num voo que podia não ter volta.

mundo mais bonito

cuido da terra,
ao ponto de deixá-la
leve, e afinada o suficiente
para receber o seu jardim azul.

carinhosamente me apego,
recito versos por entre a relva
e trato com água minha futura mãe sepulcral.

quando vejo ecoar o sol,
que bate nas verdes folhas e brilha,
sei que a garoa nos encontrará,
serena fina paz.

ouço passos subterrâneos,
dentro de mim,
quebrando minhas peles,
quebrando o brando ser.
querendo mais de meus sentidos.

segunda-feira, julho 5

seis horas da manhã

tenho três passos, só.

paciência,
              minhas pernas
              são o tempo, sabido.      
              amigo do ser lua
              aguardo cair da noite,
              mas o sol acaba de nascer.

saliência,
             desses sentidos.
             moralisando meus olhos
             de soturnos pensamentos,
             que afloram torturas e
             prisões internas de vã distância.

abismo,
            que vez em quando
            machuco ao cair.
            pois equivoco meu presente
            achando-o futuro,
            que é, para mim, tão belo e forte.
            pensando-o como vida,
            sabendo-o pouco.          
            pois ando cego, como os homens.

[todos homens são cegos,
nadadores de turvas águas
onde enxergam somente o próprio nariz.]

tenho três passos,
e minhas pernas cansam.
oro para ter-las
quando o luar chegar,
pois ai,
não será andar,
terei de olhar fundo.

quinta-feira, julho 1

terreno dos sonhos

negocie loucuras,
e veja ao certo quem te vê.

compilações do barão itabirano,
ou do negro carioca,
que ficam sentados em meu mudo criado,
que me traz águas e frases, cinzeiro, balas,
óculos, lápis, caderno e  linhas.

vejo essas negociadas loucuras,
bailando por entre seus olhos,
pelo seu avesso,
e quando venho para esse mundo,
quando venho pra cá,
morro no palco
bem mais velho do que eu.

um esforço futuro,
grato,
apoiando em meu ombro,
esperando a hora de trocar a máscara.

o que vejo nos olhos do palco,
não vi não vejo e não sei
quando encontrarei
paisagem que me eleve tanto,
à outros céus.

comidos por uma distância,
maior do que a minha para com
imortais letreiros nostalgicos.

me afeta,
olfato,
tato,
visão.

e esta é o que me resta.
mas de olhos no escuro,
o vídeo dos sonhos,
imaginado.
sem saber ao certo se a forma
é a mesma.
se cabelos ornam com o vestido.

imagino mais e mais.
mais intenso mais tenso.
fico tenso mais e mais.
ilumino minhas loucuras
com overdose de orquestra utópica,

que é voz e o azul no pano.